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Desconhecer as línguas sempre produz a intolerância

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Giba Net: Desconhecer as línguas sempre produz a intolerância

domingo, 22 de novembro de 2009

Desconhecer as línguas sempre produz a intolerância

(*) Nelson Valente


Agora, a unificação ortográfica tornou-se viável, de certa forma respeitando-se ainda o critério fonético (ou da pronúncia) em que se baseia na ortografia portuguesa. Mas desde logo um fato que nos tranquiliza: morreu o trema em palavras portuguesas ou aportuguesadas. Era um sinalzinho que não servia mesmo para nada.

Cabe-nos denunciar o mau uso da língua nessas formas de comunicação, para que seus erros não venham a ser motivo de vergonha para nós. Entre as incorreções que destoam no uso da língua, são frequentes pequenos descuidos, até perdoáveis, mas há casos de barbarismo contra a pureza da língua nos aspectos sintáticos, regenciais, ortográficos, sem falarmos de troca tão comum de tratamento, como também de organização ilógica de ideias, o que acarreta, frequentemente, ambiguidades e interpretações errôneas de pensamento. A língua é uma força biológica: não se pode modificá-la com uma decisão política. Pode-se, quando muito, influenciar o uso. É uma função dos jornalistas, escritores, professores e da mídia.

Um bom uso mostra-se pela flexibilidade com que as palavras são aceitas. Todas as línguas estão repletas de palavras estrangeiras que foram naturalizadas. Os editores, os donos de televisão, jornais e os críticos literários não entenderam que houve uma revolução espiritual, que o nível geral subiu. Comunidade Linguística da Língua Portuguesa: em que se luta para que o português seja reconhecido também como língua oficial da ONU; em que o português vai alcançando o 4º lugar entre as línguas mais falada no planeta. Não podemos deixar que ela se desfigure e se deturpe de maneira tão galopante, como está acontecendo nos meios de comunicação. Em geral, o erro linguístico depõe contra quem o cometeu.

Convivemos neste século (desde 1911) com duas ortografias oficiais da língua portuguesa, o que sempre foi prejudicial. Aí pode estar a razão de não ter sido o português acolhido, na família ONU, como língua oficial. Em 1931 estabeleceu-se o primeiro acordo ortográfico em ter Brasil e Portugal, sem efeitos práticos. A convenção de 1943 e depois as de 45, 71 e 75 mantiveram sérias divergências. Portugal rejeitou o acordo de 86, com a participação de toda a comunidade lusófona, mostrando que a imposição de uma unificação ortográfica absoluta jamais seria aceita.

Cada língua propõe um modelo de mundo diferente. Por isso não é possível tentar instituir uma língua universal. É preciso, portanto, tentar passar de uma língua para outra. Eu sou a favor do polilinguísmo. A diversidade das línguas é uma riqueza. Esse é um fato indiscutível, ligado, provavelmente à natureza humana. Durante séculos, não desfrutamos desse tesouro, porque sempre houve uma língua que predominava sobre as demais: o grego, o latim, o francês, o inglês. Creio que, dentro de uma geração, teremos uma classe dirigente bilíngue. Desconhecer as línguas sempre produz a intolerância. Conhecê-las, porém, não é garantia de tolerância. Nos Bálcãs, os sérvios e os croatas entendem-se, e contudo... No passado, os que se revoltavam mais ferozmente contra o colonizador haviam estudado na metrópole. Pode-se massacrar uma população conhecendo-se perfeitamente sua língua e sua cultura.

O conhecimento torna-se, então, um elemento de irritação ou de rejeição, do mesmo modo que um marido e sua mulher podem acabar brigando cada vez mais à medida que vão convivendo. A língua tem razões que a própria razão desconhece. Minha filha, que é bilíngue, pediu à sua mãe uma noite dessas: “Mamãe, conte-me uma Geschichte.” Para ela, Geschichte é o conto, a história de Chapeuzinho Vermelho. Para nós, é História em 12 volumes.

Os franceses fazem de conta que brigam com o inglês, mas têm medo mesmo é do alemão. Desde a queda de Berlim, a Europa do Leste transformou-se num bolsão de poliglotismo alemão e há muita probabilidade de que o alemão se imponha na Europa! Nunca, no mundo, alguém conseguiu impor a língua estrangeira dominante.

Os romanos foram mestres do mundo, mas seus eruditos conversavam em grego entre si. O latim se tornou a língua Européia quando o império romano desmoronou. No tempo de Montaigne, o italiano era o vetor da cultura. Depois, durante três séculos, o francês foi a língua da diplomacia. Por que o inglês, hoje? Porque os Estados Unidos ganharam a guerra e porque é mais fácil falar mal o inglês do que falar mal o francês ou o alemão. O que não impede que os franceses falem de uma "colonização" de sua língua pelo inglês.

O filólogo Antônio Houaiss costuma dizer que “a língua portuguesa tem enorme vitalidade e cresce toda noite”. Quando dirigiu os trabalhos de montagem e edição do Vocabulário Ortográfico, uma obrigação da Academia Brasileira de Letras, totalizou cerca de 350 mil verbetes, mas hoje desconfia que o número possa ter subido para 400 mil.

O acordo ortográfico de unificação da nossa língua não passa de 2% desse total, estaremos diante de aproximadamente oito mil vocábulos para serem apreendidos pelos que usam o idioma como ferramenta de trabalho, como é o caso de professores, escritores e jornalistas.

Segundo o acadêmico, Arnaldo Niskier: “É preciso, porém, ainda mais agora com a decadência do ensino e a enormidade de erros veiculados pelos meios de comunicação, distinguir o que pode ser (ou vir a ser) que agride o vernáculo, transfigurando-o, impregnando-o de palavras e expressões alienígenas, absolutamente dispensáveis, tolos modismos e até mesmo erros crassos”. A unificação chegou em boa hora.


(*) é professor universitário, jornalista e escritor.

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